Um blog à beira de um prozac. Reflexões sobre pós-modernidade, criadores publicitários, artigos acadêmicos, vida real, memórias, xingamentos, declarações de amor e desaforos em geral.
A pré-estréia de um beijo.
E porque prometi ao Francisco que hoje iria até ele só pra lhe dar um beijo, o dia já amanheceu beijado.
Tudo o que fiz antes suscitou em som de dentro o roçar macio de bocas, cortina nublando o olho em lembrança antecipada, alheado o pensamento, o gesto desamolecido da intenção do músculo, sem saber mais a que vinha.
Um beijo a entregar!...Só porque me prometi em lábios ao Francisco, até o café que passei para um gole trivial de acorda-menina me inebriou diferente. A água borrando o pó gorgolejava mansa dizendo anda, anda, que hoje ela vai beijar Francisco!
No bosque em frente, em cada galho escondido dos eucaliptos, a bemtevizada se algariou em malícias dedo-duras avisando a vizinhança que tinha visto, sim, bem me visto: aqui se preparava um beijo pra Francisco.
E porque a boca no rosto e, ao redor dele, a moldura, o ritual de pentear também já começou antes, muito antes de um mero banho cotidiano. Cada jorro da água que molha a cabeça desenhou boas-vindas ao beijo antecipado, se intrometendo nas raizes, escorregando entre os dedos e o shampoo, zerando tudo que o sabão lava para que o beijo em Francisco chamasse carícias novas de se enovelar em pelos.
Então, os pés, nem sempre coadjuvantes explícitos, bem se diga, mas, uma mulher que preza o Francisco a quem beijará jamais olvidaria o zelo de cada unha e calcanhares, porque, se sabe, mulher que beija assim - de promessa feita - traz sempre em si a tácita disposição de enroscar o pé no homem a quem enlaça o pescoço. Que beijos têm disso: impelem a desnudamentos não planejados, súbitas vontades de arrancar sapato e roupas, desdomadas e imprevisíveis implosões hormonais.
E, ainda que eu só houvesse jurado beijo, e ainda que beijo se doe com singela boca e saliva e língua, neste dia cuidei de todos meus avessos e direitos, em cuidados de noiva prometida. Não importa se Francisco merece, não importa se Francisco é rei ou mendigo de quereres, se me retribuirá em dentes e delírios, ou simplesmente selará o encontro, seu ósculo, uma vulgar reticência.
Neste dia em que prometi a Francisco um beijo, minha mercadoria tão frágil e fugaz carregaria dentro a infinita delicadeza da fêmea servindo em doce bandeja o flash fátuo da eternidade do afeto. ( Graça Craidy)
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