Um dia,
escutei uma garota na mesa ao lado, num bar, explodir num desabafo: “- Eu não
quero acordar amanhã de manhã só porque não morri!”
Aquele só-porque-não-morri
ficou ecoando nos meus ouvidos, cheio de significados, e me ocorre que essa é
uma bela frase pra todo mundo explodir - por direito - quando a vida começa a
ficar assim meio preto e branca, quando o dia seguinte parece sempre igual, que
nem no filme Feitiço do Tempo, em que o cara acorda exatamente no mesmo dia,
todos os dias, e vai enlouquecendo, enlouquecendo, até mudar o seu jeito de ser
e destravar o seu relógio. O filme é uma metáfora
interessante do que precisa ser feito, naquela fase da vida em que você parece
estar caminhando numa esteira, sem nunca sair do lugar. Pare de fazer a mesma
coisa, que a coisa deixa de ser a mesma, ora! Não parece claro?
Ri tempos atrás quando um
médico amigo me explicava as regras de bem-viver, tão óbvias, dizia ele, que
chegam a ser simplórias: 1. se uma coisa está dando certo, continue. 2. se não
está dando certo, pare. 3. se você não sabe o que fazer, não faça nada, até
saber.
Qualquer semelhança com
Deixa a Vida Me Levar, do Zeca Pagodinho, não é mera coincidência. O que é
deixar a vida levar a gente senão continuar quando tá dando certo, parar quando
tá dando errado e não fazer nada, antes de receber um sinal de que lado o vento
tá mais propício?
Não é de repente que as
coisas parecem iguais. A gente é que não escuta, não vê, não se comove com os
sinais que a vida e o corpo nos mandam. A gente, que é tão reparenta com
os outros, costuma ser cega,
insensível e surda pra pôr reparo em si própria. Não fosse assim e você teria
notado que aquela ânsia de vômito aparece sempre na hora em que você tem que ir
praquele trabalho chato, aquela tosse surge cada vez que você tem que engolir o
mesmo sapo pela milésima vez, aquele herpes pinta justamente quando você se
obriga a fazer o que seu corpo já cansou de mandar recado que não quer fazer. E
assim por diante. Até ficar doente de verdade.
Ou então, você inventa que
quer porque quer uma coisa agora e fica dando murro em ponta de faca e nada de
dar certo. Enquanto isso, milhões de outras coisas interessantes passam por
você feito borboleta convidando a voar por outras plagas e você nem tchum,
porque está que nem cavalo com viseira, obcecado – que, por sinal vem de
“tornar cego” em latim - pela idéia fixa de ir por aquele caminho.
O sujeito acorda de manhã
faceiro, assobiando, legal! Vida tá boa. Tudo le suele? Toca o barco. Outro,
não. Acorda de mau-amor, como disse sabiamente a filhinha dum amigo meu, um dia
em que ele acordou rabujando: - Pai, você está de mau-amor? Grande garota! Entonce, acordou de
mau-humor? Algo hay.Tem gente que azedou e nem
percebe. Dormiu, sonhou, lavou os pensamentos na noite, virou a página do dia e
acorda rançoso? Tá na cara que esse mau-humor é mau-amor, seja mau-amor de
falta de beijo, de falta de vida, seja mau-amor por si próprio. Tá na cara que
tem que mudar e não se dá conta.
Aí eu pergunto: que bem maior existe na vida
que a própria vida? Dinheiro? Poder? Fama? Nada paga uma boa gargalhada. Nada
paga você ter saúde de nem perceber a máquina maravilhosa do seu corpo
funcionando azeitadinha para o que der e vier. Por isso, preste atenção no
que a vida e o seu corpo lhe gritam ou sussuram, querido leitor, pois tenho
certeza que você também, como a menina lá de cima, não quer acordar amanhã de
manhã só porque não morreu. (Graça Craidy) ( Arte: Gartic)
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Betina Dourado escreveu:
ResponderExcluirbom hein, Prof!!!! Não era a toa que eu a-do-ra-va tuas aulas! Beijo
Patrizia Donatella Streparava escreveu:
ResponderExcluirLindo Graca e me pegou de frente ...ja to espalhando
Maria Cristina Barriquello Wayhs escreveu:
ResponderExcluirMuito bommm Graça !!!!!!
Ananda Fagundes Velho escreveu:
ResponderExcluir:D Graça sua liiinda :*
Graça lindinha, muito bom de se ler...Mesmo azeitando tudo tem dias que a gente podia não acordar (durante um tempo mesmo), mas não morrer....rs
ResponderExcluirBel